quarta-feira, 23 de junho de 2010

Socialismo E Comunismo - distinções


Ensaio

Socialismo e Comunismo

É possível encontrar na mídia e nos livros didáticos algumas distinções entre 'socialistas' e 'comunistas'. Que o primeiro é um 'comunista moderado' e que o segundo é um 'socialista exaltado', ou que o socialista é um 'reformista' e que o comunista é um 'revolucionário'. Na verdade, ambos os grupos são muito próximos, são a 'Esquerda' do espectro político, pois lutam por igualdade e justiça social.

Mas há uma diferença: enquanto os socialistas acreditam na democracia (mas avançada que a 'democracia representativa liberal'), os comunistas insistem em defender uma 'ditadura do proletariado', e acusam os socialistas de 'reformistas' e 'oportunistas'. O 'radicalismo' dos comunistas é responsável pela 'extrema esquerda' que faz cessar o diálogo e leva assim ao 'totalitarismo' (de classe ou de partido).

Os socialistas (não meramente por 'reformismo') esperam conservar os melhores avanços políticos e tecnológicos da burguesia (e sua promessa de liberalismo), que é uma superação do absolutismo e clericalismo medieval, ao adotar a divisão de poderes (executivo/legislativo/judiciário), o Estado laico (separação Igreja - Estado), o habeas corpus (integridade humana), até o sistema de previdência (descentralizado, porém).

A questão do Estado: tanto comunistas quanto socialistas esperam um sistema político sem Estado, mas não chegam ao ponto de desejarem abolir de imediato a estrutura do Estado, como é o desejo dos anarquistas e dos radicais liberais. Na verdade, não há uma substituição coerente e justa da 'figura estatal', tão elogiada pelos fascistas (o Fascismo é um Estatismo. Disse o Duce Mussolini: “Tutto nello Stato, niente al di fuori dello Stato” (Tudo no Estado, nada fora do Estado”)

Porém, enquanto os 'fascistas' defendem o Estado hierárquico de cima-para-baixo, como um regime militarista, com clara distinção entre oficiais e soldados, quem manda e quem obedece; os socialistas desejam o Estado de baixo-para-cima, na forma dos 'conselhos'; os comunistas alegam a necessidade de uma 'ditadura do proletariado”. E os anarquistas esperam um não-Estado (ou no máximo uma estrutura não formal de 'federações' autônomas, não hierarquizadas -mas 'harmonizadas', ou seja, uma sociedade mais 'horizontal'.

Outra diferença básica entre Socialismo e Comunismo é a questão do Trabalho. E dos meios de produção. A quem pertence? O que cada um recebe? O Comunismo seria o fim da propriedade particular, e todos teriam o que necessitam (“A cada um segundo suas necessidades”). Seria o ideal, mas não é possível. Veremos. O Socialismo espera que cada um receba segundo o seu trabalho. Mas aí seria Capitalismo!, alguns dizem. Mas enquanto no Capitalismo existe uma desigualdade de oportunidade e de acesso às riquezas, pois “uns são mais iguais que outros”; no Socialismo, as oportunidades são mais equilibradas – todos tem o mesmo ponto de partida quanto aos critérios sócio-econômicos, as diferenças serão somente aquelas fisiológicas e as de caráter - e somente não trabalha quem não pode e quem não quer! Quem não quer trabalhar deve receber o mesmo que os trabalhadores?

Para isso é necessário dar um fim as divisões de trabalho: os que mandam e os que obedecem. Os que administram e os que trabalham realmente. E não exaltar uma classe sobre outra: dizer que o Proletariado é melhor que os Especialistas. Mas: acabar com Proletariado e com Especialistas. Findar as distinções: trabalho mental e trabalho braçal. Todos realizando ambas as 'modalidades' de trabalho: sendo pensado e sendo executado. Não transformar todos em 'proletários' – o que seria nivelar por baixo, um plebeísmo – mas possibilitar que todos sejam aptos ao trabalho metódico e manual. “Ditadura do proletariado” é um contra-senso: afinal, quem quer ser 'proletário'? Quem deseja uma 'ditadura'?

Quem defende uma 'ditadura do proletariado' apenas se prejudica. Não é uma 'propaganda', ou um 'slogan', muito promissor. O importante é desenvolver a democracia e acabar com a exploração do trabalho.
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por Leonardo de Magalhaens
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quarta-feira, 2 de junho de 2010

O que é mesmo SOCIALISMO?




Socialismo não é meramente anti-capitalismo, muito menos capitalismo reformado, ou 'Capitalismo de Estado' (que muitos chamam de 'socialismo real'). E Socialismo não é Comunismo, e muito menos 'ditadura do proletariado'. Socialismo não é anti-democrático, é superação da Democracia parlamentarista burguesa, liberal, representativa, por uma Democracia real, direta, sem intermediários (a classe dos políticos).



Ser socialista não é meramente ser anti-capitalista, assim como ser anti-capitalista não significa ser de 'esquerda', pode ser um medievalista, um monarquista, um corporativista, um fascista, um anarquista, um hippie, um esotérico-neo-pagão, etc. Em suma, mais do que se posicionar contra os 'males do capitalismo' é assumir a construção da nova sociedade socialista. O Socialismo é a sobrevivência da humanidade. Precisamos escolher: Socialismo ou barbárie?
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O que é mesmo o Socialismo?
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Diante das desinformações da mídia e dos pseudo-didatismos, há toda uma gama de confusão propositadamente articulada em torno do termo 'socialismo'. Confunde-se Socialismo com Comunismo, e então se diz que houve um “Socialismo real” na Rússia (na ex-URSS), ou que a China (e Cuba) é um “socialismo repressor”, ou que Coreia do Norte demonstra bem que a 'liberdade' só existe no Capitalismo.


Assim, muitos pensam que já existiu o 'socialismo' ou que este ainda existe, e trata-se de um 'sistema repressor', enquanto o Capitalismo seria o 'melhor dos mundos possíveis'. Ou que o Socialismo é sempre anti-democrático e que visa 'uniformizar' os cidadãos, onde todos vestem macacão de operários numa severa “ditadura do proletariado”.


Mas, é preciso esclarecer. O Socialismo não é nem pretende ser um “Capitalismo de Estado” nem uma “ditadura do proletariado”. Pois não almeja uma “estatização dos meios de produção” ou uma “proletarização da sociedade”, mas uma “coletivização dos meios de produção” a serem gerenciados pelos cidadãos, em democracia direta, sem burocratas e classe política. Não visa uma “ditadura do proletariado”, mas a plena democracia e o fim do proletariado – ou seja, uma classe de homens-mercadoria que negociam a própria força-de-trabalho. Não é fazer todos serem 'proletários', mas findar com a divisão de trabalho que perpetua patrão e empregados, administradores e operários, dominadores e dominados.


O Socialismo não é Populismo, nem Sindicalismo, nem 'social-fascismo', e muito menos Corporativismo. Mas é, sobretudo, Coletivismo, Auto-gestão e Cooperativismo. Esclareça-se mais: é essencial a auto-gestão, mas nem toda auto-gestão é socialista. Veremos depois.

O Socialismo não é Sindicalismo, nem reformismo, nem assistencialismo, mas a superação de tudo isso – engendrado pelas desigualdades de renda no seio do Capitalismo. É superar o Sindicalismo, pois havendo os Conselhos, operando através da democracia direta, não há necessidade de uma classe de sindicalista, pelegos, aliviando os atritos da 'luta de classes'. O sindicalismo não é superação, é manutenção da exploração. Quanto ao reformismo e assistencialismo é o continuísmo da miséria – havendo pobres continua-se a 'caridade', distribuindo renda através de 'favores' e 'bônus'. Não transforma as relações sociais de produção – onde uns ganham mais do que outros – mas providencia-se uma 'esmola' para os que saem perdendo no 'jogo'.


O Socialismo não é Planificação, nem 'trabalho severo', nem sequer uma mistura neo-tecnológica de taylorismo-fordismo-toyotismo. É a superação de todo labor – no sentido de que não deve haver separação entre trabalho e prazer – pois a ênfase não é sobre 'cotas de produção' ou 'exigências de mercado', mas o importante são os produtores, as pessoas que trabalham e que vão se realizar através do trabalho. A produção deve servir aos produtores – e não o contrário. Os trabalhadores devem deixar de serem peças e engrenagens de um enorme mecanismo de exploração e devastação que acaba por ameaça a sustentabilidade ecológica planetária.



Socialismo não é Comunismo nem Anarquismo. Se o Comunismo prega a 'ditadura do proletariado' e o slogan “a cada um segundo suas necessidades”, e o Anarquismo prega uma 'sociedade alternativa' sem autoridades e hierarquias, apenas coordenação, o Socialismo lembra que o importante é desenvolver a Democracia, elevando o nível político e participativo dos cidadãos, de forma a aperfeiçoar os instrumentos democráticos. Assim uma Democracia direta poderá substituir a atual Democracia representativa que depende ainda de uma Burocracia (o Estado) e uma 'classe política'. Também é essencial saber que não há sociedade sem autoridade. Importante é que tal autoridade não seja externa nem imposta, mas um poder compartilhado coletivo – que todos devem obedecer.


E que o compartilhamento dos benefícios sociais são proporcionais ao nível de trabalho. Todos tendo acesso ao trabalho, obviamente. Assim, será ' a cada um segundo o seu trabalho'. E não seria um 'neo-capitalismo', pois no Capitalismo o que ocorre é um desigualdade de oportunidades. Dizem que o pobre não 'sobe na vida' por ser preguiçoso! Mas quantos não estão excluídos do 'mercado de trabalho'? Assim o 'mercado' apenas reforça a desigualdade – e culpa os pobres pela própria pobreza. Mas, havendo trabalho para todos, e sabendo que há ainda sobram certas desigualdades (fisiológica e de caráter) é importante que todos sejam incentivados ao trabalho – não para gerar 'alguns mais do que outros' – mas para o progresso coletivo.


O Socialismo não é 'padronização' ou 'nivelamento por baixo'. Mas, antes, uma sociedade mais igualitária, com acesso ao trabalho, ao estudo, ao poder de decisão e produção, sem divisão entre 'trabalho mental' e 'trabalho braçal', sem gerentes, encarregados e escravos com carteira assinada. Não que todos se tornem 'proletários', mas que superem as lutas de classes e avancem rumo a bem-estar coletivo e não apenas de uma classe ou outra, com o prejuízo das demais.


Portanto, a importância de pensar coletivamente, em políticas de tolerância, de voluntariado, de pluriculturalismo, em prol da diversidade cultural diante da hegemonia do Capital que tudo compra e tudo vende. Não apoiar uma suposta 'diversidade' apenas por que há 'segmento de mercado' para comprar supérfluos, enquanto a maioria da população se esforça para adquirir o básico para a sobrevivência. Precisamos realmente manter uma 'segmentação em linhas de produtos' apenas para assegurar o privilégios dos consumidores endinheirados? Ao contrário, é necessária a produção básica, não guiada por estatísticas de consumo e lucro. Repetimos: a produção não é mais importante que os produtores, os cidadãos em trabalho coletivo.



Nos próximos Ensaios acompanharemos em detalhes as questões aqui levantadas.
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Leonardo de Magalhaens

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Socialismo não é Estatismo

Socialismo não é "estatização dos meios-de-produção"


Não será a 'ditadura do proletariado' (como encontramos nas páginas 59 a 61 do Manifesto), por que não haverá proletariado - haverá associações de cidadãos produtores. Não haverá distância entre produzir e gerenciar, não haverá uma classe de administradores (burocratas, tecnocratas) agindo por um poder 'delegado pela classe proletária. O objetivo do Socialismo não é levar os 'pobres' ao poder - mas acabar com a condição de Pobreza. Possibilitar a cada cidadão trabalhar e dividir as riquezas coletivamente.

Uma vez que é difícil um retorno à pequena propriedade produtiva (como antes da Revolução Industrial), ainda as fábricas congregam condições de produção e eficiência, e não podem ser atomizadas, fragmentadas. As fábricas não devem ser estatizadas, mas gerenciadas pelo coletivos dos trabalhadores - os Comitês - em tarefas executadas por técnicos e operários.

Os Comitês decidem pelas jornadas de trabalho, pela divisão dos lucros, pela escala de produção, pelas ampliações de estrutura industrial. As jornadas - depende das necessidades - podem ser diurnas e noturnas, para absorver a mão de obra excedente, além de reduzir as jornadas de outros turnos. Ao contrário de 1000 operários trabalharem - com estresse - por 8 horas, poderá haver o trabalho de 2000 operários, com cada grupo de 1000 trabalhando apenas 4 horas. Mais pessoas trabalhando menos.

O rodízio de função é essencial para que os operários conheçam cada etapa da fabricação de um produto e possam intervir para melhor gerência da produção, evitando assim a repetição do processo alienatório intensificado pelo Taylorismo e pelo Fordismo, além do Toyotismo, os sistemas de produção onde o trabalhador opera como uma máquina, restrito a uma função apenas na linha-de-produção. O rodízio possibilita que em dado período o operário cuide do corte, em outro momento da solda, e depois da moldagem, e depois da pintura, e assim por diante, assimilando o conhecimento que possibilite sua opinião e ação num conselho coletivo.

(Nota: para saber mais sobre Taylorismo, Fordismo, Toyotismo, ver info: http://www.bloco.org/index.php?option=com_content&task=view&id=468&Itemid=47 / http://pt.wikipedia.org/wiki/Taylorismo / http://pt.wikipedia.org/wiki/Fordismo / http://pt.wikipedia.org/wiki/Toyotismo )

O Socialismo é mais do que 'participação nos lucros' - os meios-de-produção pertencem ao coletivo de técnicos e trabalhadores, que administram a produção através dos Comitês. Os próprios operários preservam sua autonomia de gerência - agindo em concordância com o planejamento em coletivo com outros Comitês - sem a burocracia de 'representantes'. Inclusive, a profissionalização de 'representantes' - semelhantes aos políticos e sindicalistas - é impedida pelo rodízio de função, que se articula enquanto durar uma determinada tarefa.

Ou seja, não há representantes intermediários entre os proletários e o (digamos) Estado, mas a união dos Comitês na execução das projeções de produção e distribuição. As tarefas são delegadas - temporariamente - aos executores, que prestam contas ao Comitê.

O 'Estado proletário' cuidará da transição - não 'ditadura do proletariado', pois o proletariado deixa de existir - quando administra os bens antes nas mãos das oligarquias. Encontramos claramente no Manifesto, "O proletariado utilizará seu domínio político para arrancar pouco a pouco todo o capital à burguesia, para centralizar todos os instrumentos da produção nas mãos do Estado, ou seja, do proletariado organizado como classe dominante, e para aumentar o mais rapidamente possível a massa das forças produtivas." ("zu zentralisieren und die Masse der Produktionskräfte möglichst rasch zu vermehren", Marx & Engels)

O Estado - ou antes a União dos Comitês - na mão dos proletários - é necessário para centralizar as decisões e planejar as cotas de produção. É a atuação de BAIXO PARA CIMA (via política dos Comitês) que impede o Estatismo, o horror totalitário quando a máquina estatal mostra-se sem disfarces tal um "grande Leviathan" (vide as obras de Hobbes e A. Smith, e mais atualmente M. Foucault)

A parceria pública e privada (PP) é possível no Socialismo? Tais distinções não terão mais sentido. Uma vez que não haverá mais 'lucro privado' nem Estado enquanto 'interventor', tal parceria inexiste no Socialismo. Os Comitês decidem o que as fábricas necessitam e são notificados do que as Comunidades necessitam, e através de negociações ambas as partes planejam as soluções. O Estado é a UNIÃO de todos os Comitês - e nada mais.

Assim, também outro sistema hierárquico - as Forças Armadas. Em lugar de um Exército composto de uma elite de profissionais, uma 'casta' oligárquica armada, que se mantém distanciado do povo, pairando sobre os cidadãos (até sendo uma ameaça) será necessário ao povo reunido compor uma Milícia Popular, com cada cidadão fisica e mentalmente saudável a receber um treinamento militar para a eventualidade de um conflito (interno ou externo), capacitando-o a atuar na defesa do governo socialista.

Assim como encontramos na Guerra Civil Espanhola as brigadas internacionais (ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Brigadas_Internacionais ) com sua organização hierárquica disposta por tarefa, sem que os níveis hierárquicos se tornem diferenças de status, onde os soldados não temem os oficiais, e todos se tratam por 'camarada', sem aquela rígida estratificação dos Fascistas.

Um verdadeiro exército democrático na forma de milícias populares, onde todos aqueles que se preparam fisicamente, também podem conhecer táticas e estratégias, além de técnicas de guerrilha, além dos conhecimentos de artilharia e engenharia. Não uma 'casta' a dominar os civis desarmados, mas todos prontos a defenderem uma sociedade mais eficiente e igualitária.
por Leonardo de Magalhaens

sábado, 15 de maio de 2010

Democracia e Ecologia




DEMOCRACIA E ECOLOGIA


Umas das preocupações do novo Milênio é a tentativa de equilibrar
o discurso ecológico com o interesse econômico. Manter um nível de
produção e consumo, e ao mesmo tempo, assegurar a conservação do
meio ambiente em escala global.

Obviamente surgem dificuldades. O sistema capitalista vive da
produção e do consumo, gerando descartáveis e lixo em escala nunca
dantes vista! As pesquisas atuais levam em considerações as
conversações na Conferência Rio-92, com seus tratados que não
saíram do papel, e com as medidas paliativas da Conferência de Kyoto,
a que perdeu força devido a intransigência dos norte-americanos
quanto às cotas de emissão de carbono.

Essa necessidade de ‘preservação’, em seu aspecto “idealista”,
surgiu na geração pós-Segunda Guerra, com seu ecologismo
peace and love” do movimento hippie, do desejo de voltar à natureza,
uma vez que a “civilização” é repressora e artificial. Mas nada propunham
de “alternativo” além de um estilo de vida, dissociado do sistema
econômico. Assim, muitas dessas comunidades não puderam se
manter, a menos que reduzissem o número de agregados. Ou seja,
o hippie é ‘excludente’ por excelência. Não é um estilo de vida que possa
ser estendido a toda a sociedade. A Revolução Industrial, desde o
século 18, criou um mundo sem retorno. Qualquer ruptura seria um
cataclisma.

Assim como seria um cataclismo a manutenção dos níveis de
produção e consumo. Se todos os países e povos consumissem como
os países e povos do dito Primeiro Mundo, os recursos globais já
teriam se esgotado e todos estaríamos vivendo numa enorme lata de
lixo! Logo, é hipocrisia falar em “conciliação”. Ou se aplica um freio
ao capitalismo ou se preserva a natureza. Fora isso, o “ecologismo”
seria outra ‘ideologia’ para vender produtos.

Com os problemas energéticos, toda uma gama de empresas pas-
saram a pesquisar as “fontes alternativas de energia”, como a aéolica
(a do vento), a solar (de painéis solares), dos ‘biofuels’ (tipo gás metano),
para evitar a queima dos combustíveis fósseis (o petróleo e derivados)
e o uso limpo, porém deveras perigoso, pois instável, da energia nuclear
(espectral desde o acidente de Tchernobyl, em 1986, na Ucrânia.) A
busca do “combustível ideal” apenas começou, uma vez que as com-
versações globais são no sentido de “reduzir as emissões de compostos
de carbono” que geram o chamado “efeito estufa” (greenhouse effect),
provocando uma elevação da temperatura da Terra, o famigerado
“Aquecimento Global” (Global Warming)

As conferências se sucedem (a mais atual em Durbai) como uma
epopéia diplomática, enquanto os setores particulares cooptam todo
um leque de profissionais (os técnicos em meio ambiente) para asses-
sorar as linhas de produção e diminuir os danos ambientais. Tudo muito
gradativo e paliativo. Nenhuma mudança estrutural significativa. Não
há adesão popular ao problema.

Alertadas sobre a emissão de gás carbono e excesso de queimadas e
acúmulo de lixo, as autoridades tem sido levadas à demagogia e às inter-
venções “pra inglês ver”. Pois os reflorestamentos não renovam as áreas
desmatadas, resolvendo apenas o problema da próxima geração de
árvores a serem cortadas (logo, preocupação comercial!) e os recursos
hídricos não são preservados (uma vez que não se ‘renovam’ lençóis
fleáticos e assemelhados), o que torna mero discurso essa de
“preservação das fontes e mananciais”, quando os terrenos onde
se instalam os “lixões” sequer recebem sondagens para determinação
de profundidades das águas de subsolo.

Uma problemática que se mostra perigosa, pois recebe “tratamento”
tardio. O capitalismo não se preocupou nem um pouco com a conser-
vação, uma vez que cercou e desmatou áreas, eliminou espécies animais
e vegetais (levou muitas à extinção!), devastou regiões inteiras com ativi-
dades extrativistas mineradoras, promoveu uma produção contínua de
mercadorias que, logo descartadas, geram montes everests de lixo, que
demoram séculos para se decomporem.

O clamor pelos “biodegradáveis” bem mostra o nível de desespero
(igual a proliferação dos ‘diet’ e ‘light’ com a onda de obesidade e elevação
dos casos de enfartes) sem real mudança estrutural, uma vez que inventar
sacolinhas e garrafas biodegradáveis não resolve o problema do ‘consu-
mismo’, que é justificado para a existência da produção. Um ciclo vicioso,
portanto. Produção necessária para criar renda e emprego, e consumo
estratosférico para absorver os níveis de produção. Cada vez se produz
mais, e se consome em excesso. Ocorre aqui uma ‘necessidade’ retroali-
mentada. Ou seja, a medida que a produção cresce, “criam-se” neces-
sidades (principalmente através da propaganda comercial)

No fundo, o que ocorre? Uma preocupação com a preservação
ambiental ou uma ânsia de novos lucros? “Não me interessa ser
ecológico, desde que eu ganhe com isso”, ou ainda, “se ajudo a ecologia,
tudo bem, mas meu interesse é o lucro”, assim pensam muitos
empresários, cinicamente. Pensam na ‘biodiversidade’ como outro
lucro, no patenteamento de ervas com fins medicinais, etc. e alegam
a necessidade de proteger a Amazônia tanto dos madeireiros e
garimpeiros, quanto dos exploradores ‘gringos’.

Muitos passam a investir em biofuels (biocombustíveis), ou em
energia solar, ou instalam hectares com hélices ao vento, ou aderem
aos “créditos de carbono”, na promessa de reduções, enquanto tonela-
das de garrafas são jogadas em rios, sem reciclagem, ou infinidades de
pneus formam colinas nos subúrbios, ou peças descartadas se acumulam
em ferro-velhos, ou oceanos de celulares usados mostram o nível de
descarte e desperdício de um sistema sem planificação.

É um quadro desolador. Somente a vontade popular pode dar
legitimidade à uma verdadeira reação. É necessário viabilizar os instru-
mentos democráticos para que as soluções possam surgir. Caso contrário,
a impossibilidade de um discurso ecológico conviver com os atuais níveis
de produção e consumo. Seria necessário frear ou planificar o atual
sistema econômico, e seu exagero de mercadorias, senão o “ecologismo”
não passará de oura ‘ideologia’, e vai parar na “lata de lixo da História”,
junto com o anarquismo, o bolchevismo, o movimento hippie.

Nota: A Internet é farta em informações sobre cada uma das medidas
aqui mencionadas, daí o não aprofundamento específico sobre cada
uma. Excederia o objetivo do ensaio. A leitura dos protocolos é reco-
mendada, para constatação do lapso entre o ‘ideal’ e o ‘real’.

Jan/08

Leonardo de Magalhaens
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quarta-feira, 5 de maio de 2010

A Coreia do Norte é comunista?




A Coreia do Norte é Comunista?

Ou poderíamos perguntar: a China é comunista? Cuba é
comunista? O que é comunismo? É possível o comunismo?

Estas e outras questões estão de volta, desde os testes
nucleares realizados pela Coreia do Norte em 2006, 2008
e neste mês de maio/2009, aterrorizando os vizinhos
Coreia do Sul e Japão. (Assim como o Iran – fundamentalista
islâmico – tem assombrado o Oriente Médio)

Para começar uma diferenciação Comunismo de Socialismo.
O primeiro termo vem de longa data, nas névoas da História.
Há autor que defenda que as primeiras comunidades tribais
foram 'comunistas' (até que alguém cercou um pedaço de chão
e disse que era dele, e ninguém foi lá reclamar, como bem
ilustrou Rousseau, surgindo assim a famigerada PROPRIEDADE
PARTICULAR, onde “não pode entrar os não-convidados”)
Sendo o Comunismo uma forma 'ideal', isto é, uma ideia da
perfeição social, com todos possuindo o necessário para
sobreviver, não havendo uns com mais (os ricos) e outros
com pouco (os pobres). No comunismo não há diferença de
renda, nem diferença de status/poder.

Em artigo anterior (A Impossibilidade do Comunismo) já
argumentei sobre a inviabilidade de uma sociedade 'comunista',
pois os seres humanos são variados, e suas necessidades e
ambições não são iguais. O que gera cidadãos mais apáticos,
ou mais insatisfeitos, ou mais rebeldes. Além disso, Freud
argumenta que um impulso saciado apenas leva a outro impulso
em busca de satisfação. (O que seria ideal? Cada família com
um carro? Com uma cota no clube? E se algumas famílias
fossem maiores? Como regular a quantidade de filhos? Como
calcular a renda para cada família? Etc)

Resumindo: o Comunismo é uma bela 'ideia', só isso. E não
podemos culpar Marx, com seu olhar humanista-positivista
(que o diferencia dos humanistas liberais burgueses), por
acreditar que o Comunismo fosse possível. Mas, quanto ao
Socialismo, também de períodos anteriores, pode-se dizer
que sua versão 'científica' (diversa das 'utópicas') faz sentido.
(Escrevi uma série de ensaios sobre o Socialismo, suas ideias
e práticas. Está no meu blog http://leonardomagalhaens.zip.net/ )
Resumindo: o Socialismo requer uma sociedade avançada
em relação ao Capitalismo. Exige gerência dos recursos, um
Planejamento planificado da produção e do consumo. Não se
pode 'saltar' etapas' (como muitos esquerdistas desejam) e
passar de um mundo feudal para um mundo socialista.
Por que? Pois, a sociedade precisa conhecer um sistema
de poderes distribuídos: a Democracia.


Sem a Democracia, a chamada 'Ditadura do Proletariado'
acaba por devorar os próprios filhos, e um grupo de
Burocratas acaba por corromper o Poder dos proletários,
e assumir cargos em excessos, gerando uma Nova Classe,
a Nomenklatura, onde 'uns são mais iguais do que outros'.
Sem a Democracia o Socialismo não é possível.
Tanto que dizer 'socialismo democrático' é puro pleonasmo.
Mas a Burguesia com seu 'ideal' liberalista continua a insistir
que a única Democracia possível é a Liberal. O que é um contra-
senso: uns possuem mais do que outros, e assim têm maior
acesso ao Poder.

Voltando a pergunta inicial: a Coreia do Norte é comunista?
Obviamente que não, se nem chegou ao Socialismo, como
poderá ser Comunista? O que existe nos domínio do ditador
Kim Jong-il (filho do ditador King Il-sung) é uma Ditadura do
Partido
(dito) Comunista, um verdadeiro stalinismo em pleno
século 21, uma peça de museu. O mesmo tipo de governo
que desgraçou a Albânia, a România, a Alemanha oriental.
Um partidarismo doentio, um estatismo hermético, sem as
consultas às bases populares (por mais que usem o termo
Democracia Popular”, e os bancos estatais chamem “Banco
do Povo”). Quando o povo quer falar, é logo silenciado por
tanques e artilharia.

A Coreia, ocupada pelos japoneses, expulsos em 1945, foi
logo ocupada por russos e norte-americanos, que impuseram
seus regimes políticos, dividindo a península (o mesmo
ocorreu na Alemanha, Viet-Nam, China), entre Estatistas
(ditos Comunistas) e Capitalistas (protegidos pelos Ocidentais),
no calor da chamada Guerra Fria, que lá na Coreia acabou
por esquentar muito entre 1950 - 53, com guerra declarada, e
que não teve Tratado de Paz (portanto, um mero armistício,
a guerra AINDA não acabou.) E uma dinastia de ditadores,
de pai para filho, ocupa o 'trono', dizendo governar para o
Povo, no melhor estilo Populista (não sei se em coreano
existe o termo Populismo...) O ditador norte-coreano precisa
manter seu poder, e assim mobiliza o povo contra o Inimigo
externo, em militarismo ideológico e paranóico. Nada mais
distante do que Marx desejava.

E a China é comunista? Não, por mais que assim declare a
imprensa burguesa, para desmoralizar o Comunismo
(inexistente) e o Socialismo (possível, mas impedido pela
educação capitalista-selvagem). A China é uma Tecnocracia
Estatista Unipartidarista
, numa economia de Capitalismo de
Estado, que nada tem do regime idealizado por muitos e
estudado por Karl Marx. Que na verdade é o verdadeiro
atingido nessas críticas todas. Ninguém se dedica a uma
leitura atenta do pensador judeu-alemão, e vai logo atirando
pedra. A 'demonização' de Marx mostra o medo profundo da
Burguesia. O medo de perder o Poder para o Povo.

E Cuba é comunista? Não, é outro estatismo, que lembra muito
o Estado italiano fascista: um paternalismo partidário, um
assistencialismo estatista, onde o Povo não tem voz, qualquer
discordância é silenciada nas masmorras. No mais, a figura de
Fidel Castro apenas desmoraliza a Esquerda
: o
ditador é uma anti-propaganda. Passa a ideia de que Socialismo
é Ditadura. E que Capitalismo é Democracia. O maior dos
absurdos. Mas a mídia consegue vender a farsa. Por que os
sistemas ditos socialistas são Ditaduras? Por que enfrentam
uma Contra-Revolução e precisam montar um “Governo forte”,
onde as liberdades civis se evaporam, os cidadãos viram
reféns de uma minoria. Ou seja, troca-se os Capitalistas
pelos Estatistas-Burocratas.

Em resumo: a Burguesia não hesita em chamar de 'Comunistas'
os sistemas demagogos e tirânicos da China, Cuba, Coreia do
Norte, no intuito de desmoralizar o 'Socialismo', que acabou
associado ao termo 'Comunismo'
. E ambos associados a Ditadura.
(Comunista sempre soou como um palavrão na mídia capitalista)
Tudo acaba por ajudar aos interesses burgueses de associar
Capitalismo e Democracia como se fossem sinônimos, e não
contraditórios. Escondem que a verdadeira Democracia é o
Socialismo.

Igualdade, Liberdade e Fraternidade são termos ideais, só
existem em Conceito, enquanto Dignidade, Diversidade e
Justiça Social são termos do Socialismo Científico, que visa
dividir os recursos disponíveis de formar a impedir excessos
e faltas, opulências e misérias. É isso que Karl Marx queria
dizer com o termo infeliz “ditadura do Proletariado”, pois num
sistema sem ricos e sem pobres, não há Domínio de Classe, e
assim sequer existirá 'proletariado', mas Cidadãos senhores do
Trabalho, e não escravos do Mercado. Não um nivelamento por
baixo (proletarização) mas uma elevação dos menos favorecidos
aos padrões de vida satisfatórios, respeitando os limites dos
recursos naturais, tão largamente explorados pelo Capitalismo,
um sistema desigual, exploratório e, além de tudo, anti-ecológico.


Por Leonardo de Magalhaens

http://leonardomagalhaens.zip.net/

domingo, 25 de abril de 2010

Diversidade, Pluralidade, Socialismo e Democracia


Diversidade, Pluralidade, Socialismo e Democracia


A produção de mercadorias tem saturado os mercados e os modos-de-vida com imagens e estereótipos, que rotulam as diversas manifestações culturais e estilos sociais, como mais um artigo a ser consumido. A pluralidade existe desde que seja interessante como 'mercadoria' para atrair novos consumidores.


Tudo está à venda - roupas e opiniões, notícias e diários pessoais, obras-de-arte e fotos de celebridades - e a pluralidade é aceita não por um fim em si mesma (como uma amostra da criatividade humana, por exemplo) mas como mais um artigo para o balcão.


A diversidade de estilos de vida, de expressão artística, de opção sexual, de vestimenta, de cor e etnia, quando não explorados comercialmente, evidencia o quanto somos diversos e diferentes, e o quanto somos hesitantes diante dos excêntricos - aqueles que flutuam além das convenções/padrões.



Imaginam muitos que um sistema socialista seja o templo do puritanismo - onde todo desvio é rotulado de 'dissidência' e 'subversão'. Obviamente que sempre haverá o dissidente e o subversivo. Nem todos se adaptam a um viver COLETIVO - há os sociopatas, os marginais (aqueles que se marginalizam, não exatamente excluídos pelo sistema econômico), os criminosos. Estes não são socializados nem são socializáveis. Ou são prisioneiros ou são eliminados.


Certamente para muitas pessoas não interessa o agir coletivo. Possuem interesses egoístas e querem lucrar e dominar. Suas ações passam a ser voltadas para sabotar e deteriorar as novas relações sociais - são os reacionários, os contra-revolucionários . As sabotagens inviabilizam o coletivo e causam o aumento da repressão. Uma escalada de repressão levaria ao aparelhamento policial e fortalecimento do Estado, ao contrário de seu mero papel de planejador em conjunto com o coletivo de Comitês (que poderá ser chamado de federação, ou assembléia ou diretório setorial) Assim, é necessário que os cidadãos reacionários devam ser afastados dos Comitês.


Sendo a administração via Comitês e sob direção compartilhada, aqueles que se colocam contra o Coletivo são passíveis de sofrer advertência e excomunhão. Sempre foi assim e sempre será. Sempre haverá os dissidentes e subversivos. Os seres humanos se dividem em aqueles que aprovam e aqueles que são do contra.



O que deve mover o sistema socialista é o compromisso com a COLETIVIDADE. O indivíduo vem em segundo plano. Negação da Liberdade? Ora, Liberdade é um conceito metafísico. Num sistema econômico não há liberdade. No Capitalismo, por exemplo, se o cidadão não tem dinheiro ele passa privações e pode dormir na rua e morrer de fome. No Socialismo, ou o cidadão se adapta ao sistema COLETIVO ou ele está excluído. Infelizmente é assim.


Mas o Socialismo - o próprio nome diz - é a administração social dos meios-de-produção e coordenação dos níveis de consumo. Consumo planejado? Sim, pois se a humanidade (e principalmente a população do 1o mundo) continuar a consumir nos atuais níveis, precisaremos de 4 planetas Terra de onde extrair matéria-prima e onde jogar lixo e resíduos industriais. O Consumo deve ser planejado e controlado. O excesso de mercadorias inúteis e banais que enchem as prateleiras apenas mostram a bizarra face irresponsável do atual sistema de produção. Mas cortar produção seria cortar postos de empregos? Sim, mas libertaria os proletários das linhas-de-produção de banalidades, e possibilitaria um melhor emprego da mão-de-obra em outras produções mais necessárias. Afinal, quantos sequer possuem calçados e vestuário? Apenas para que alguns tenham carros luxuosos e comidas finas?


Este consumo planejado livrará o Mercado dos excessos. Mercado? Claro, o Mercado não pode ser descartado. Assim como haverá vendas, bares, mercados distritais, moeda corrente. O que não será permitido é a onipresença e dita auto-regulação do Mercado. Um Mercado que torne a todos meros reféns - como vemos atualmente. O Mercado é inerente a necessidade humana de trocas. O que não será permitido é o 'reinado' do Mercado.

"Não será permitido? Ressoa como ditadura!" Realmente, pois como ressaltou Marx e Engels, no começo da mudança (a Revolução) haverá a necessidade violenta de desapropriar os oligarcas - nenhuma mudança se faz sem o recurso da força. Não que os socialistas sejam a favor da violência - mas a violência é inerente ao processo histórico. As guerras são as marcas ao longo da História, assinalando a ascensão e queda dos Exércitos e Impérios.


A pior violência é a violência empregada pelos oligarcas contra os proletários - seja durante as greves ou manifestações - seja através de leis que favorecem uns poucos contra a maioria. A pior violência é a exploração da mão-de-obra e a extração da mais-valia de uma classe que não possui os meios-de-produção que foram apropriados e concentrados nas mãos de poucos, que caprichosamente dispõem de existências e dignidades alheias.


A violência cotidiana e a guerra civil evidenciam o quanto a luta-de-classes é real. Se a mídia interpreta de outro modo é a evidência de sua co-optação pelas classes dominantes, e o quanto o meio midiático é cúmplice, atuando como legitimador em seu papel de 'indústria cultural' (ver Adorno e Horkheimer, "Dialética do Esclarecimento", ou nos sites http://www.urutagua.uem.br//04fil_silva.htm e http://pt.wikipedia.org/wiki/Ind%C3%BAstria_cultural )


A mídia - coligada com os grupos dominantes - passa uma imagem de 'oportunidades iguais' e de 'possibilidade de ascensão social' que inexiste. Aqueles que 'sobem' em status social nada mais fazem do que acumular riquezas extraindo a mais-valia da 'mercadoria' maõ-de-obra, ou por sorte (ou azar) quando jogam na loteria ou praticam atos de corrupção e desvio de verbas públicas (e não são denunciados e julgados).

Os proletários e os técnicos - aqueles que produzem e administram - no poder terão a chance (e quiçá a aproveitem!) de mudar a soberania caótica do Mercado e colocar uma ordem nesse cassino em que se perde a soberania popular. O Mercado será disciplinado. Enquanto não se produzirem calçados para todos os cidadãos, não se deve perder tempo com agasalhos de luxo. Enquanto não se iluminarem todas as residências, não se deve perder tempo em erguer monumentos faraônicos. O luxo de uns é a miséria de outros.


A divisão equitativa dos meios-de-produção e o consumo controlado dos bens-de-troca e dos bens-de-uso propiciam uma regulação e equilíbrio do Mercado e impede suas flutuações de oferta e procura. Exceto quando ocorrerem grande distúrbios da natureza (terremoto, secas, furacões, etc) o Mercado terá uma oferta e procura controlada. E um excedente será reservado para as épocas de catástrofes naturais.



O Socialismo não olha para o passado, mas para o futuro. É a vanguarda do Iluminismo e a denúncia do Liberalismo. É o reconhecimento das pequenas empresas das corporações de artesãos medievais e a proclamação da eficiência das linhas-de-produção. É o louvor das comunidades e a exaltação da luz artificial. O socialismo não vem libertar o indivíduo em si-mesmo, mas propiciar a libertação coletivo.



Ninguém está livre, quando seu irmão está sob correntes.



Por

Leonardo de Magalhaens

sábado, 17 de abril de 2010

Democracia & Ideologia - ensaio

DEMOCRACIA E IDEOLOGIA

Leonardo de Magalhaens

Em nosso ciclo de ensaios sobre a Democracia e as várias esferas da vida social, com seus progressos e deficiências, é de se pensar se o “ideal democrático” não seria tão-somente outra ideologia, outra forma de “engodo retórico” para os demagogos à disposição. Mas precisamos entender o que seja “ideologia”.

Constituída por um conjunto de idéias, que totalizam uma visão de mundo (“Weltanschauung”), a Ideologia pode ser o fiel retrato das representações e aspirações de uma classe, como também um instrumento de manipulação (doutrinação dogmática), através de uma “propaganda ideológica”. Assim, de uma “teoria das idéias” pode-se derivar uma “legitimação pelas idéias”, onde as representações tornam-se mais ‘fortes’ que a realidade. Na verdade, a Ideologia acaba por se distanciar da realidade. Assim, Marx, quando defende que as idéias nascem da estrutura social, define a ideologia como um conjunto de “abstrações das relações de produção”.


Karl Mannheim, sociólogo alemão, em sua obra de 1930, “Ideologia e Utopia”, reafirma Marx ao esclarecer que “foi a teoria marxista que primeiramente concretizou a fusão das concepções particular e total de ideologia. Foi esta teoria a que primeiro concedeu a devida ênfase ao papel da posição e dos interesses de classe no pensamento.” Assim, a ideologia torna-se sinônimo d “falsa consciência” (falsches Bewusstsein), onde o burguês pensa como burguês, e o proletário pensa igual todo proletário, e cada classe tenta vender sua concepção de mundo para a outra classe: o burguês hegemônico controla as demais, e o proletário quer reunir os demais na “revolução proletária” contra o burguês. (Obviamente que o marxismo de crítica à ideologia, tornou-se também ideologia!)

Daí a “questão epistemológica”: qual a base da criação de idéias? Qual a classe social do pensador? Em que meio social a idéia é encarada como ‘verdade’? (pois uma ‘verdade’ para o burguês não será ‘verdade’ para o proletário, e vice-versa) Pois se as idéias nascem do contexto social, elas mudam quando ocorrem mudanças da conduta humana, seja econômica ou politicamente. A idéia é, portanto, mutável, sempre dependente dos objetivos da vida cultural. Afinal, é isso que Marx quer dizer com “a existência social é que determina a consciência” (em sua “Uma Contribuição à Crítica da Política Econômica”, analisada por Jean-Paul Sartre em “Crítica da Razão Dialética”, onde aborda os limites do Marxismo enquanto ‘ideia’ e ‘ideologia’.)

Mas quando é que as idéias se tornam ‘ideológicas’? Segundo Mannheim, é quando elas se distanciam da realidade, pois o julgamento da ‘ideologia’ (e da ‘utopia’) é diante do QUE É, do contexto atual do que julgamos “realidade”. “O conhecimento é distorcido e ideológico quando deixa de levar em conta as novas realidades ao se aplicar uma situação, e quando tenta ocultá-las o refleti-las com categorias impróprias.”(em “Ideologia e Utopia”) Assim, diferenciando “ideologia” de “práxis”, pode-se dizer que “ideologia” são idéias sem possibilidade de prática social, ou doutrinas (segundo Napoleão, que atacava assim aqueles que se opunham ao seu Império), onde dizer que o discurso do outro é “ideológico” é dizer que o pensamento dele é “irrealístico”.

No mais, uma realidade que depende muito da “posição social do observador”, a determinar sua “visão de mundo” (ou “concepção de mundo”) e sua “consciência de classe”, onde cada “grupo social” quer conservar sua visão (e seus interesses) e se esforçando para estender sua visão aos demais grupos, e se possível moldá-los segundo essa visão, através de uma “pedagogia política”, que não passa de uma “propaganda ideológica”, mais ou menos totalitária (dependendo do ‘aparelho estatal’ e do regime político, se mais inclinado a uma ditadura) (nota 1)

Para se situar o que seja “democracia” diante de um “conjunto de idéias”, façamos aqui um resumo da definição (segundo leituras de “esquerda” e de “direita”), onde “democracia” seria um regime político no qual a soberania popular tem voz ativa para tomar decisões básicas importantes sobre as questões essenciais das políticas de bem-estar social (não exatamente “Welfare State”, pois até os fascismos se preocupavam com “bem-estar social”) Assim o “direito básico” do povo (a vontade popular) é tomar decisões – diretamente ou através de representantes eleitos.


Uma bela definição. Mas então surge o problema da “decisão coletiva”, que seria a combinação das variadas decisões através de um diálogo público (nas Câmaras, nas Assembléias, no Parlamento) e decididas, se não por unanimidade, pelo menos pela “maioria dos votos”. Daí o “domínio da maioria”, o maior número de preferências (uma vez que é difícil a ‘unanimidade’ numa pluralidade de “visões de mundo” e interesses de classe). E numa votação favorável à maioria, a minoria deve ser tolerada (podendo até originar uma “oposição”) e aceita para novos debates e possível conciliação. (O que não ocorre nos “totalitarismos”, onde os opositores são eliminados, enquanto partido e enquanto pessoas.)


O diálogo e a tolerância são dois pilares. O terceiro é a “igualdade”, no enunciado “Um homem, um voto”, onde cada indivíduo com um voto de valor igual. Não importa a classe, a renda ou o credo, mas o valor do voto no processo eleitoral (desde que não se observe fraude). Antes somente os homens de renda votavam, estando as mulheres e os pobres fora do processo. Uma “democracia” ao velho estilo ateniense, diga-se. Mas as participações das feministas (as sufragistas) e dos proletários pressionaram a uma maior representatividade na vida pública.

Se igualdade é um dos pilares do regime democrático, é de se pensar se a desigualdade não seria uma ameaça. Ainda que “igualdade social” seja promessa socialista, enquanto a democracia representativa aceita a pluralidade de renda e status. A “democracia socialista” seria um “ideal”, não uma realidade. E não sabemos ainda como alcançar tal ideal (talvez assim permaneça, justamente por ser ‘ideal’)

“Democracia socialista” é pleonasmo? “Democracia liberal” é contradição em termos? Se o socialismo for o aprimoramento da democracia, sem qualquer ‘processo revolucionário’ (que sempre é seguido por reacionarismos e resvala para autoritarismos), se o socialismo nasce das perfeitas instituições democráticas, então “democracia socialista” é pleonasmo, no sentido de que a democracia plena é a aquela em que a “igualdade de renda” se aproxima da “igualdade de voto”. O verdadeiro socialismo, por sua vez, precisa ser democrático, pois a desigualdade de renda precisa ser combatida para não se renovar uma concentração de renda, o que inviabiliza a democracia, onde uns manipulam mais que outros, devido à possibilidade de acesso aos meios de comunicação (mídia) e exercem pressão financeira. (nota 2)


Na democracia representativa, o “representante” (vereador, deputado, senador) fala em nome da ‘base eleitoral’ que o elegeu, não em seu nome (na “teoria democrática radical”, de Thomas Jefferson, etc) Assim o tom arbitrário dos atuais representantes destoa muito do ideal de vontade popular, estando os representantes distanciados de seus eleitores, e propondo leis das quais se dizem ‘donos’, como se o importante fosse inventar leis e mais leis, e não o que o povo deseja (“Leis demais e uma Constituição idealista não enche a barriga de ninguém”, um colunista já ironizou) Por outro lado, as democracias ditas “populares” caíram nas mãos de demagogos e ditadores que não hesitaram em criar ditaduras do “partido único”, dizendo agir assim em nome do povo (vide os ‘direitistas’, fascistas, etc, e também os ‘esquerdistas’, com Mão, Pol Pot, Ceaucescu, etc)

Contudo, em pleno “multipartidarismo” com a pluralidade de opiniões e interesses (o partido depende das bases eleitorais, sua legitimação depende do grau de comunicação com as mesmas e o nível de ‘aprovação’), ocorre uma perda de legitimidade,o que permite uma ampla manobra demagógica, onde tudo é ‘em nome do povo’, e nada de consultar esse mesmo ‘povo’. (nota 3) E todos se dizem plenos democratas! Até os religiosos se dizem democratas e até obviamente os fascistas do século 21 virão dizendo-se “democratas”. É o que se constitui um “totalitarismo retórico do discurso democrático” (vide Chomsky, Bobbio, Kurz, Zizek, etc) onde a democracia não passa de mais um discurso disponível no mercado.


Culpa da “democracia liberal”? Afinal, temos mercado livre, livre expressão, liberdade de associação, imprensa livre, Estado laico, liberdade religiosa, tudo isso, mas sem real “democracia econômica”, onde as disparidades de renda e poder financeiro faz com que ‘os de cima’ mandem e ‘os de baixo’ obedeçam. Como a “propaganda é a alma do negócio” (e sabemos disso desde Goebbels!) e “é melhor dizer que fez do que fazer” (algo de Machiavelli?), a “democracia liberal” tornou-se mero ‘slogan’, uma bonita ‘palavra de ordem’, tipo “lutar pela democracia” ou “morrer pela democracia” ou ainda “a superioridade da democracia”, mas sem perguntar qual democracia! E sem planejar como vamos construir essa “democracia”! e dizem que já estamos exportando a democracia (digo, o Ocidente), quando os Estados Unidos invadem nações para “exportar a democracia”, assim na Coréia, na Indochina, no Haiti, no Afeganistão, no Iraque, e, futuramente, no Iran), como se a democracia fosse um produto com receituário, a ser aplicado em qualquer lugar, sem analisar o contexto sócio-econômico! (nota 4)


O problema da democracia é o excesso de promessas. Dizer que vai resolver tudo e trazer paz e liberdade. Mero discurso. A democracia não deve ser baseada na “liberdade” ou na “felicidade”. Pois ‘liberdade’ não existe (“ou todo mundo é livre ou ninguém é livre”, segundo Bakhunin)(*), assim erguer a liberdade como estandarte é encenar outra propaganda ideológica (sem suásticas ou foices-e-martelos). E a felicidade? Promessas impossível, uma vez que somos insaciáveis, insatisfeitos por condição existencial (segundo Freud e Sartre), e felicidade não passa de promessa para as peças publicitárias (sempre inventando novas necessidades, para que o consumo se perpetue ad aeternum)


(*) citação correta: “Apenas a liberdade dos outros me torna verdadeiramente livre


A democracia deve basear-se no diálogo, na representatividade e na tolerância, pois sem pilares surgem fissuras para a discriminação e o autoritarismo, torna-se paraísos dos demagogos, com um acúmulo de promessas não-cumpridas a gerar frustrações, a perder a legitimidade junto às bases eleitorais, que não hesitarão em entregarem o poder a um grupo de ‘salvadores da pátria’. (Alguns acham mais cômodo – e mais barato – manter uma ‘família real’, contudo é retrocesso. A divisão de Poderes, os custos do Parlamento, as viagens do Executivo, tudo constitui o elevado preço a se pagar pelo equilíbrio instável da democracia.)

Se a demagogia atira a democracia nas garras dos autoritarismos, a luta por hegemonia arrasa a legitimidade, quando os Estados passam a pressionar (e controlar) seus cidadãos, como uma “guerra fria” constante. É definido quem pode se pronunciar, e quem pode protestar, num jogo de cartas marcadas onde a ‘revolta’ já está no enredo, onde em nada poderá abalar o poder constituído, mas, ao contrário, o fortalecendo mais, em nome da ‘segurança nacional’, do bem-estar futuro, em que um neo-nacionalismo (em plena era de globalização) não hesita em resvalar para um ‘xenofobismo’. (nota 5)

Tendo em mente a complexidade do tema, este ensaio (e todos os outros) deseja apenas uma olhada os progressos e deficiências do viver democrático. Do mundo democrático que é preferível ao ‘autoritarismo sutil’ no qual vivemos. Democracia não existe, está sendo construída (e se quisermos construí-la). E é de se pensar, se a democracia, o “menos pior dos sistemas políticos”, segundo Churchill, ainda nem se estruturou, o que esperar de sistemas ideais, idealistas e utópicos, como são exemplos o comunismo e o anarquismo?

fev/mar/08

Leonardo de Magalhaens



Notas


(1) “O termo ‘ideologia’ aparece pela primeira vez em 1801 no livro de Destutt de Tracy, ‘Élément d’ideologie’ (Elementos de ideologia). Juntamente com o médico Cabanis, com De Gérand e Volney, Destutt de Tracy pretendia elaborar uma ciência da gênese das idéias, tratando-as como fenômenos naturais que exprimem a relação do corpo humano, enquanto organismo vivo, com o meio ambiente. (...)”
“Os ideólogos franceses eram antiteológicos, antimetafísicos e antimonárquicos. Pertenciam ao partido liberal e esperavam que o progresso das ciências experimentais, baseadas exclusivamente na observação, na análise e síntese dos dados observados, pudesse levar a uma nova pedagogia e uma nova moral. (...)”
“O sentido pejorativo dos termos ‘ideologia’ e ‘ideólogos’ veio de uma declaração de Napoleão no Conselho de Estado em 1812 [onde] Bonaparte invertia a imagem que os ideólogos tinham de si mesmos: eles, que se consideravam materialistas, realistas e antimetafísicos, foram chamados de ‘tenebrosos metafísicos’, ignorantes do realismo político, que adapta as leis ao coração humano e às lições da história.”
“Marx conservará o significado napoleônico do termo: o ideólogo é aquele que inverte as relações entre as idéias e o real. Assim, a ideologia, que inicialmente designava uma ciência natural da aquisição,pelo homem, das idéias calcadas sobre o próprio real, passa a designar, daí por diante, um sistema de idéias condenadas a desconhecer sua relação real com o real.”
“Mas Comte usa o termo num sentido próprio ao original, ‘conjunto de idéias de uma época’, o poder deriva do saber.”

Fonte: “O que é ideologia”, 1980, de Marilena Chauí, Editora Brasiliense.


(2) O socialismo enquanto evolução do igualitarismo diante da lei (nos regimes democráticos) rumo a um igualitarismo econômico. É possível. Os regimes ditos ‘socialistas’ que existiram não passaram de tentativas de “capitalismo de Estado”. A Rússia conhecia a democracia? E a China? E Cuba? Segundo Mannheim, um “socialismo germânico”, caso os ‘comunistas’ subissem ao poder em 1919, seria muito próximo de um socialismo bolchevique (russo), pois ambos seriam burocratizados e centralizados, ou seja, nem seriam “socialismos”, seriam mais “estatismos”.

(*)o problema 'ideológico' do termo (rótulo) 'socialista'. Pois os comunistas se dizem 'socialistas', mas nem todo socialista é comunista, e também muitos anarquistas se dizem 'socialistas', mas nem todo socialista é anarquista. A luta é comum quando se combate o capitalismo e o autoritarismo, mas se divide quanto a existência do Estado, da 'ditadura do proletariado', da autogestão e socialização dos meios de produção.


(3) Segundo palavras de Norberto Bobbio, “A Demagogia não é propriamente uma forma de Governo não constitui um regime político, é, porém, uma praxe política que se apóia na base das massas, secundando e estimulando suas aspirações irracionais e elementares, desviando-a da sua real e consciente participação ativa na vida política.”


(4) O problema da representatividade nas eleições norte-americanas não é novidade. Todos sabem que é um jogo de cartas marcadas entre dois partidos majoritários – o Democrata e o Republicano – que pouco se diferenciam. O mesmo que ocorria na Grã-Bretanha, com os Conservadores (tories) e os Liberais (whigs), até a ascensão dos Trabalhistas. O problema seria o “voto facultativo”? Novos paridos e candidatos não conseguem subir por falta de eleitores não arregimentados pela mídia? Então se vota entre os conservadores de direita e os conservadores de centro (o mesmo drama da França e da Itália, onde a Esquerda se articula ora com um bloco ora com outro), enquanto em outros países multipartidaristas, os vários setores se mostram em plena combatividade em busca de eleitores, em alternância de poder, em coligações e fusões de gabinetes, promessas de cargos ministeriais, etc), como são exemplos o Brasil, a Argentina, a Alemanha, etc.


(5) As democracias venceram os fascismos na II Guerra Mundial. Certo? Mas usando métodos de fascismo! Ainda que o maior mérito de Churchill tenha sido o de manter a ‘democracia representativa’ durante a crise da Guerra (tanto que ele nem foi reeleito!), o mundo democrático nunca foi o mesmo. As ‘áreas de influência’ da nova hegemonia pós-guerra não possibilitaram mais uma real democracia, em tempos de “Guerra Fria”. Hitler, com seu III Reich, destruiu o resto de comunismo na URSS e a possibilidade de plena democracia nos EUA, pois para sufocar os fascismos, os governos aliados passaram a usar ‘métodos fascistas’, com governos centralizados, com sindicalismo atrelado, uma polícia secreta atuante, uma corrida armamentista, uma censura de informações, um controle das críticas, uma caça ao inimigo do Estado, ou seja, todo um receituário que Hitler (e Stálin) nunca hesitou em usar. E Hitler, em plena derrota, considerava o novo Tzar Stálin o modelo de “nacional-socialista”, o nacionalismo com sua máscara de bem-estar social.